A internet e as redes sociais deram megafones para os outrora surdo mudos da sociedade, alterando por completo a balança de poder no mundo moderno. O cidadão comum ganhou mais força nas relações de consumo e de cidadania. Está empoderado. Agora tem voz, mouse, seguidores e a senha do cartão de crédito.
Agora tem um protagonismo inédito, deixando de ser mero consumidor passivo do que a mídia ou grupos organizados distribuem para se tornar um produtor de conteúdo. Todo cidadão e internauta hoje é também um pouco repórter, um pouco médico, um pouco louco.
E isso é bom, porque democratiza o acesso ao debate de todas as causas, mas ao mesmo tempo tem seus riscos, que não são poucos. Não há um trabalho de curadoria de conteúdo, como no (bom) jornalismo tradicional, nem tampouco checagem da veracidade da notícia, ficando muitas vezes difícil separar aquilo que é relevante e verdadeiro daquilo que é mero boato desprovido de fundamento.
No meio dessa avalanche, há muita gente saturada de informação e ao mesmo tempo desinformada, porque mais do que consumir informação o que importa no final das contas é ser capaz de produzir reflexão.
Agora as opiniões são formadas de maneira difusa, complexa, amalgamada, misturadas num liquidificador social de infinitas fontes, indecifrável. Tudo junto e misturado ao mesmo tempo agora.
E o programa de TV vai parar no YouTube que vai parar no celular do estudante no ponto de ônibus, que vai virar uma piada compartilhada no WhatsApp. E a manchete do jornal é comentada por um locutor de rádio, que é depois regurgitada no Twitter, que depois é assunto no boteco, que depois vira um post no Facebook. E nessa alquimia incontrolável as ideias e opiniões vão se formando, as verdades às vezes vão se (de)formando (ou virando “pós verdades”), num processo contínuo, um tanto caótico e incontrolável.
É curioso notar que, a despeito de toda a gama de informações que podemos coletar hoje em dia, cujo ápice se dá na figura do chamado “Big Data”, nunca foi tão difícil compreender e analisar o produto final do que se possa chamar “Opinião Pública”, e muito disso se dá em decorrência dessa produção um tanto aleatória e incontrolável de conteúdo, criando uma fragmentação de ideias e pontos de vista muito grande, que no agregado até podem formar um “todo”, mas que não sobrevivem a um olhar mais atento. Não existe mais um único todo, mas múltiplas frações, infinitos redutos, clusters, nichos, segmentos. O mundo já não cabe mais nas divisões simplistas de direita ou esquerda, Flamengo ou Fluminense. Os moldes de antes já não servem para as formas de hoje.
Pesquisas de opinião contemporâneas, aliás, têm demonstrado essa dificuldade.
Recentemente foi divulgada a pesquisa “O Brasileiro e a Política”, feita pelo Instituto Locomotiva em parceria com a eCGlobal, que aborda a relação do brasileiro com a política, e os resultados mostram uma desconcertante ambiguidade. Brasileiros que se dizem de direita apoiam que o Estado mantenha empresas estatais fortes e parte considerável dos que se dizem de esquerda defendem que os Direitos Humanos não devem valer para bandidos.
E o brasileiro é a favor da Democracia, mas contra a política. E o brasileiro é católico, mas pula sete ondinhas para Iemanjá. E o cético bate 3 vezes na madeira, e o agnóstico diz que graças a Deus é ateu.
O Brasil não é para amadores, já disse um famoso brasileiro, Antônio Carlos Jobim, que amava o Brasil e morava em Nova York.
Sim, estamos nos afogando em números como nunca antes na história, temos dados sobre tudo, mas nunca a sociedade foi tão complexa e multifacetada. Tudo que sabemos é que não sabemos nada e que nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia.
Portanto, se você acha que sabe de alguma coisa, lamento informar, mas você está profundamente desinformado.